Parem de nos matar!


Mais uma vez li um livro de crônicas de Cidinha da Silva, mais uma vez fiquei maravilhada com a obra e a escrita das histórias. O livro é composto por 62 crônicas, se não contei errado rsrsrs e apresenta uma sequência muito bacana, as crônicas se comunicam entre si, é possível perceber um alinhamento de algumas crônicas como se fossem separadas em alguns grupos, vou explicar melhor, tem um bloco de crônicas que falam sobre futebol, da página 149 até a página 167 vemos diversas crônicas com situações futebolísticas diferentes, mas todas expressando as opiniões e sacadas da escritora sobre o racismo no futebol.

Falei como exemplo esse bloco porque gosto muito de futebol, na verdade gosto mais de acompanhar esse universo do que de assistir ao jogo, pra mim o jogo é a ponta desse iceberg, todo o antes e depois é o mais importante, Cidinha traz isso, apresenta sobre as narrações, os outros atores desse universo, sobre como os narradores na sua maioria homens brancos não abordam com a seriedade que o assunto precisa o racismo em campo.

Além disso tem  ideia sexista de que mulher não sabe nada de futebol, qual mulher não comentou que gostava de futebol e não apareceu um macho perguntando “o que é linha de impedimento?” ou algo parecido, Cidinha trazer esse assunto foi uma jogada de mestra no qual ela demostra que é melhor que qualquer narrador de jogo ao abordar com seriedade sobre racismo e ao mostrar que mulher sabe de futebol sim, mulheres negras assistem, discutem e gostam de futebol.

Alguns dos outros blocos não são tão “leves” quanto o bloco sobre futebol, tem uma sequência que fala sobre algumas chacinas, uma delas aconteceu aqui no meu país Salvador, o caso dos 12 jovens do cabula, uma lembrança terrível e pior ainda o modo que as coisas se sucederam depois do ato criminoso com a fala genocida do governador. Atualmente o caso está parado na justiça e não houve nenhuma condenação, temos o grupo político Reja ou será morta, Reja ou será morto fazendo frente, lutando e sempre relembrando desse caso e cobrando da justiça seu posicionamento.

Algumas crônicas nos fazem lembrar de fatos que talvez já tenhamos esquecido e em especial teve a crônica “Matias e o boneco de Star Wars”, uma crônica linda que fala sobre representatividade, em especial entre uma criança e um jovem em países diferentes, essa é uma das crônicas de alívio pro coração e que reascende uma esperança para acreditar nessa geração que está por crescer e de que a nossa geração tem feito um bom trabalho.

Ainda nesse assunto de representatividade temos outras crônicas como “Marcha do orgulho crespo + marcha das mulheres negra”, que fala sobre a importância da estética sendo uma das formas de resistência e que isso muda com os tempos, como a própria escritora relata, na sua época (não estou chamando Cidinha de velha rsrs) a resistência e afrontamento eram os dreads e hoje em dia é o cabelo black muito grande e ouriçado. Essa diferença de gerações possibilita tanto a troca de aprendizado e nós as mais novas precisamos aprender sempre com a geração anterior que permanece na luta.

Super recomendo a leitura do livro, mas faço a ressalva de ler com cuidado, ter a cautela de parar em determinadas crônicas para respirar. Mencionei na resenha somente alguns assuntos abordados, tem muito mais no livro, Cidinha percorre por assuntos que foram muito aclamando em determinados momentos pela mídia e outros que não foram noticiados. Contudo, em todas a escritora faz um clamor para que sejamos livres para viver nossas vidas, seja no lazer, no trabalho, no afeto, em os aspectos que nos constituem.

Com esse livro #Paremdenosmatar Cidinha da Silva reafirma que as nossas vidam importam e em toda a sua completude de VIDA. Juntamente a esse grito de viver e não somente sobreviver, Cidinha honra os nossos que já se foram e faz isso com uma grande competência. Então é isso leitoras, leiam escritoras negras, leiam escritoras negras sapatão, leiam Cidinha da Silva.

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