Becos da memória - memória e oralidade


Becos da memória é um dos mais importantes romances memorialistas da literatura contemporânea brasileira.

Evaristo traduz, a partir de seus muitos personagens, a complexidade humana e os sentimentos profundos dos que enfrentam cotidianamente o desamparo, o preconceito, a fome e a miséria; dos que a cada dia têm a vida por um fio (Os editores - orelha do livro)

Cada personagem no livro vai trazer à tona um tema diferente do outro, mas todos interligados, não apenas pelo mesmo local de moradia, pois todos moram na mesma favela que está sendo desocupada, eles trazem o elo de serem irmãos e irmãs, não de sangue, mas das memórias que carregam.

Conceição utiliza bastante da memória e da oralidade neste livro, em especifico Maria-Nova vai tendo as suas memórias ativadas através da oralidade, cada história que ela escuta, seja de tio Totó, Maria-Velha, Bondade, cada fala faz com que ela resgate a sua ancestralidade e assim vai ficando mais nítido o que precisa fazer pelo seu povo, e juntamente a isso vai criando uma força dentro dela.

Um personagem que chamou bastante minha atenção durante todo o livro foi a Morte, sim a morte física, e também mental. Tio totó é o que mais sofre com a morte, tanto pelas inúmeras perdas que ela fez ele ter, como pela resistência de não querer levar consigo o próprio tio Totó, era como se existisse uma birra entre eles, por mais que tio Totó quisesse morrer este não morria, não fisicamente, mas por dentro, mentalmente, espiritualmente, e a esperança, já tinham morrido faz tempo.

Outras vezes a morte chegou no momento certo, como no caso de Filó Gazogênia, no período que a favela estava sendo desocupada, quando as pressões já estavam mais apertadas, e a família de Filó também estava com a saúde bem debilitada a morte a leva, como se quisesse poupar de um sofrimento maior que seria ter que sair da favela e não ter para onde ir.

Outro episódio de morte que teve um efeito bem direto em tio Totó, foi o acidente com os homens-vadios-meninos, que depois de uma noite de ‘divertimento’, bebida, música, pegaram o trator e acabaram colidindo levando a morte de todos, essa catástrofe fez com que o desfavelamento parasse por algum tempo e aqui aproveito para falar sobre Negro Alírio, um dos personagens que mais tocou Maria-Nova, com ele a certeza de que precisava acreditar na mudança foi aumentando, pois via a sua luta constante onde quer que ele estivesse, ele foi um dos que lutou organizando o povo contra a desocupação da favela.

Acho que a resenha ficou um pouco depressiva falei de muitas mortes, mas espero que vocês entendam que não é apenas a morte, mas o que levou a acontecer, porque acontece tanto com o povo negro, porque aconteceu tanto no período da desocupação, qual o contexto histórico destas mortes, o livro é recheado de mortes dos mais diversas jeitos e modos, por favor, não se assuste com isso, não precisa ter medo, pode ler o livro sem receio, tudo vai ter um sentido e significado, pra mim teve.

No fim (desculpa é um spoiler) Maria-Nova tem um sonho e vê que todos os homens nascem do coração de Vó Rita uma senhora que pra Maria-Nova nunca parecia estar sozinha, conto isso para vocês perceberem que apesar de tanta morte, existe a esperança, existe a luta, vai sempre existir o nascimento e por isso não podemos desistir, ficamos desanimadas, tristes, angustiadas, mas não podemos desistir, não desistam, juntas podemos ser resistência, o povo preto junto é resistência.




Comentários

  1. Becos da memória é incrível, nos envolve em uma 'viagem passada' já vivida, que é muito semelhante a realidade que vivemos atualmente, acho que a nossa realidade não muda, só nos acomodamos. Parabéns pela resenha!
    www.blogdodeivy.com

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