Leite do Peito Contos
Ao ler o título do
livro pensei que seriam uma série de contos diferentes, cada qual com seu
personagem, sua história, porém não é bem assim este livro, são contos sim, mas
contos sobre a mesma personagem e a história que transcorre em seu ambiente
familiar. É a história da própria Geni que vai crescendo na frente dos nossos
olhos e leitura.
Geni começa
relatando para nós leitoras como foi o seu desligamento com o seio e o alimento
materno, quando aquela caçula de certo modo perde este posto e outro filho ganhar
esta ocupação para ser o caçula. O que mais me chamou a atenção foi quando Geni
viu que seu novo irmão era negro e assim não precisaria chama-lo de Jesus, pois
logo entendemos segundo os ensinamentos do cristianismo que o Jesus para eles é
um homem branco.
Esse pensamento
sobre a cor dos ‘deuses’ vai aparecer novamente quando Geni questiona ao pai
qual a cor Deus, pois se Deus fosse negro o seu próprio pai poderia assumir o
cargo de ‘Deus’ algum dia, contudo, seu pai lhe responde que Deus é branco e
isso segundo as sagradas escrituras, mas na história fica nítido que seu pai é
analfabeto, logo como ele poderia afirmar com tanta veemência que está na
sagrada escritura que Deus é branco e ninguém poderia questionar senão seria
blasfêmia? Ora isso é bem simples, é a forma que fomos educados, no qual
utilizam a religião para silenciar e acomodar o povo para que estes não sejam
questionadores, pensadores e não busquem transformações para ter uma condição
de vida melhor.
Pra mim o ponto
auge da história são os contos Tempos escolares e Alicerces, eles relatam como é
devastador ouvir e aprender sobre a história de seu povo através de outras
pessoas, das pessoas que não se preocupam em formar crianças negras conscientes
ou auxiliar para a construção da auto estima e amor próprio. Já mencionei sobre
esse tema em mais de uma resenha, mas vamos lá...
Na escola
escutamos a pior versão sobre o período escravocrata, escutamos a voz do
opressor que perpetua suas ‘verdades’ para propiciar a continuidade da
subalternidade do povo preto. Sendo assim, aprendemos sobre homens e mulheres
negras que foram escravizados e só, não nos é contado sobre sua vida lá em
África antes dos seus sequestros, nem muito menos em como estes lutaram
bravamente contra este modelo de sistema. No livro ressaltam a imagem da
princesa Isabel reforçando a ideia de que o povo negro não sabe lutar por si e
sempre vai precisar de uma pessoa branca para lhes libertar.
Fica explicito
como essa irreal história sempre contada pelo Outro e nunca por nós mesmos
dentro das escolas pode ser destruidor para uma criança, como vai reforçar uma
imagem negativa. Isso corre porque destruindo por dentro as crianças é muito
mais fácil manipular quando jovem e adulto, mas o opressor prefere esquecer de que
o povo preto jamais desiste e mais cedo ou mais tarde será feita a tomada de
consciência negra com o auxílio do seu próprio povo.
O conto em seguida
destes dois contos citados é Alicerce, ele é pra mim um balsamo, um alivio para
a alma. Um lindo, sincero e singelo diálogo entre o pai e filha, esta que
decide ser professora para possibilitar algum orgulho ao pai e este que decide
trabalhar em prol do sonho de sua filha, que no fim ficamos sabendo que consegue
realizar, pois toda sua família lhe ajudou a crescer. Esta mensagem é a que
necessita se sobrepor a toda a história, de que a família, esse pequeno núcleo
preto, precisa estar em constante apoio mútuo, se protegendo dos ataques
externos, sejam racistas, machistas ou lgbtfóbico.
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