Irmã Outsider
Foi uma imensa alegria ler esse livro de
Lorde, já conhecia sua história, tinha gravado muitas das suas célebres frases,
conhecia sua imagem, mas pegar um livro com a sua própria imagem na capa,
entender o motivo das frases ditas e o seu contexto, ouvir da Lorde a sua
história, muda tudo, fica ainda melhor, dá uma injeção de ânimo, de
resistência, de esperança.
Cada capitulo é único, você pode ler até
fora da ordem que não vai ter grande problema de entendimento, eu li na ordem e
gostei da sequência do livro, mas você fique à vontade. Os capítulos que mais
me chamaram a atenção foram – Os usos da raiva: as mulheres reagem ao racismo e
Olho no olho: mulheres negras, ódio e raiva.
Neles Lorde destrincha como nós mulheres
negras estamos submersas na raiva e ódio desde crianças, como os racistas nos
colocam no lugar do não humano, jamais vou esquecer a cena que ela descreve de
quando era criança, foi sentar perto de uma mulher no metrô e essa mulher puxou
o casaco de forma brusca somente para que não encostasse em Lorde.
Além disso Lorde compartilha conosco como
podemos usar essa raiva e ódio e direcionar para o lugar certo, não para nós
pretos, mas para a causa, a fonte de toda essa situação, não foi à toa que
branquitude construiu esse auto ódio e ódio entre pessoas negras, esse é um dos
modos de nos desorganizar, e povo desorganizado não ganha nenhuma batalha.
Eu simplesmente amo o seguinte trecho no
qual Lorde muito didaticamente explica tudo:
“Toda
mulher tem um arsenal de raiva bem abastecido que pode ser muito útil contra as
opressões, pessoais e institucionais, que são a origem dessa raiva. Usada com
precisão, ela pode se tornar uma poderosa fonte de energia a serviço do
progresso e da mudança. E quando falo de mudança não me refiro a uma simples
troca de papeis ou a uma redução temporária das tensões, nem à habilidade de
sorrir ou se sentir bem. Estou falando de uma alteração radical na base dos
pressupostos sobre os quais nossas vidas são construídas.”
Trago a
fala de Lorde e já puxo para outro tema que ela escreveu lindamente, sobre
ouvir os mais velhos, ouvir os mais velhos vem de uma prática ancestral, os
nossos antepassados em África faziam isso e levaram esse ensinamento mesmo no
pior momento da vida deles. Muito está se errando por não olhar com atenção
para o passado, por não ouvir os ensinamentos dos mais velho, as pessoas pensam
logo no futuro, mas só teremos algum futuro digno para pessoas negras se
aprendermos com o passado e construirmos o presente.
“Nós nos esquecemos que o ingrediente
necessário para fazer o passado trabalhar para o futuro é a nossa energia no
presente, metabolizando um par dar origem ao outro. A continuidade não acontece
automaticamente, nem é um processo passivo.”
Nesse mesmo capitulo Lorde lança a
pergunta: “Vocês estão fazendo a sua parte?” Esse capitulo foi um texto
apresentado no final do evento - Semana Malcolm X - em 1982, mas a pergunta é
bem atual não acham?! Termino a resenha com ela por estarmos em um momento muito
propício para tal pergunta. Você pessoas não negras, antirracistas e
antifascistas, estão fazendo a parte de você???
Para o povo preto termino com outro
trecho: “Os patriarcas brancos nos disseram: “Penso, logo, existo”. A mãe negra
dentro de cada uma de nós – a poeta – sussurra em nossos sonhos: “Sinto, logo
posso ser livre”. A poesia cria a linguagem para expressar e registrar essa
demanda revolucionaria, a implementação da liberdade”.
Vamos aprender com essa nossa mais velha,
não mais presente fisicamente, mas que nos deixou tudo escrito, se instruam
povo preto, leiam, aprendam e escrevam, ouçam a mãe negra dentro de vocês.
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