Amali e sua história


Amali é o terceiro livro que leio do escritor Marcos Cajé, assim como os outros dois essa história é encantadora, não esperava outra coisa, já estou acostumada com as histórias belíssimas escritas por Cajé, a surpresa é que esse tem um toque a mais, foi escrito junto com a escritora Bárbara Santana Nogueira.

Amali é muito linda, pela capa já percebemos e ficamos bestas com tanta beleza, eu em especifico não me encanto apenas pela beleza física, mas pelo conjunto, e na história Amali se apresenta tão lindamente, esperta, questionadora e inteligente que fica muito fácil ver uma total beleza nessa pequena.

O que temos de diferente das outras histórias é que ele não se passa em África, no país Nigéria, ele se passa aqui mesmo no Brasil, na cidade de Cachoeira. Isso porque os escritores têm o objetivo de levantar a bandeira da lei 10.639/03, aquela lei que já falei na resenha do livro de Ana Célia da Silva (Retrospectiva de uma trajetória de ações afirmativas precursoras à lei nº 10.639/03).

Temos total consciência de que a escola acaba reproduzindo inúmeras opressões, segue um modelo bancário (ler Paulo Freire), cartesiano, e eurocêntrico, isso exclui toda a cultura e sabedoria negra e diaspórica, negando as crianças e jovens negros a sua verdadeira história.

Cajé e Bárbara apresentam o terreiro como uma escola, e sim neste lugar temos a escola afrocentrada que valoriza a escutatória, a oralidade e a irmandade. Oportunizando um espaço afetivo coisa que não encontramos nas escolas formais.

Dona Bibiana, a avó de Amali, em momento algum se coloca como a única detentora do saber, ela transforma a relação verticalizada de educador – educando para uma relação horizontal onde temos a mais velha e a mais nova passando por experiências e vivências diferentes no qual cada uma pode aprender com a outra.

O livro se propõem a ser utilizado em escolas para que o corpo docente tente promover um ensino saudável de um dos aspectos da cultura negra, a religião afro-brasileira, que no livro é o candomblé da nação Ketu. Esse foi um ponto que achei muito, mais muito legal, pois por vezes falamos do candomblé como se ele fosse único, tudo igual, todas os terreiros idênticos, mas não, tem várias nações, e cada casa tem o seu Orixá, no do livro é a Orixá Nanã.

Tocar nesse assunto por meio de um livro infantil traz uma delicadeza enorme, principalmente porque esta religião foi bastante envenenada pela cultura eurocêntrica transformando o candomblé em uma coisa ruim, endemonizada pela religião cristã, ficando mal vista perante os olhos da sociedade. Apresentar os Orixás relacionando aos seus elementos naturais traz um encanto que não é visto nas obras e nem na produção cultural da branquitude.

Outro aspecto importante e que aqui voltamos para falar de onde essa história está localizada é o samba de roda, por se passar em Cachoeira essa dança torna-se ainda mais especial pois no recôncavo essa cultura é muito mais exaltada, assim como aqui em Salvador temos a capoeira.

Um trecho que fica explicito que Dona Bibiana realiza um processo de ensino aprendizagem horizontal é quando ela fala para sua neta “Nosso samba de roda resistiu às marcas de tortura, está presente em mim e um dia estará em você”.

E pelo questionamento de onde começou a história ela também vai terminar, ao pé da árvore ancestral Baobá, Amali conversa com outra pequena chamada Alma e ali vai ser transmitido e multiplicado todo o nosso saber negro.

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