Bucala A pequena princesa do quilombo do cabula


Bucala é uma linda princesa quilombola, ela mora com seus pais em um quilombo chamado cabula. A menina convive com os hábitos de seu povo e se diverte. (Sinopse do livro)

A demarcação territorial feita no livro desde o título pra mim foi o que mais me marcou durante a leitura. Eu moro no Cabula e estudei na UNEB, quando descobri que este espaço tinha sido no passado um quilombo teve um efeito muito especial para mim, pois percebi que de alguma forma eu estava ligada pelo chão onde habito com o passado de resistência dos meus ancestrais.

Em 2016 participei da formação de uma chapa para disputar o Centro Acadêmico (CA), o grupo acatou a sugestão de uma colega e denominamos a chapa de Quilombo do Urubu, ela fez essa sugestão pelo fato de estarmos estudando em uma universidade neste território, começamos a estudar sobre esse quilombo, sobre Zeferina e foi nesse período que conheci essa história, essa minha parte da história do passado que tentaram ao máximo esconder de mim, que tentam esconder da gente.

Quando eu era criança estudei em uma escola daqui do bairro mesmo, lembro que uma vez teve um trabalho para falarmos sobre os nossos bairros, sobre o cabula o que falaram foi que era uma fazenda e tinha plantação de laranja, apenas isso e nada além disso, só fui descobrir tudo durante a graduação mesmo, para terminar esse relato digo que a chapa que participava que era considerada uma chapa militante perdeu, a outra chapa que era uma chapa academicista ganhou.

Eu acredito que é de extrema importância o povo preto estar escrevendo literatura infantil, estar trazendo o mais cedo possível a nossa história e o nosso pertencimento para as crianças, construir uma representatividade dentro deste ramo da literatura. Já fiz resenha de outros dois livros infantis e agora faço do livro de Davi Nunes, todos estes autores (as) estão nessa árdua tarefa de acessar a linguagem infantil que não é fácil e de fazer com muita competência esse trabalho.

Bucala é uma história do cotidiano, é relatado como é a vida da menina no quilombo do Cabula. O livro é exclusivamente feito de uma narrativa, nos é apresentado como é a relação de Bucala com os seus pais, com os animais, a natureza, com os mais velhos, e também faz demarcações necessárias sobre os opressores daquele período que perpetuam até hoje porém com nomes diferentes, os escravocratas e capitães do mato.

É reforçado na história a valorização dos mais velhos, a importância da história oral, e de como com este instrumento podemos fazer reviver memórias que nos retorne aos nossos ancestrais. Isso demonstra que nossa história conseguiu sobreviver por causa do poder da palavra contada dos mais velhos para os mais novos. Também no livro é apresentado a relação de Bucala com a religiosidade, em especifico com a deusa das águas doces.

Davi Nunes é de Salvador, graduado em letras vernáculas pela UNEB, é poeta, contista e professor de literatura e língua portuguesa. Este foi o primeiro livro de Davi que li o próximo será Zanga um livro de contos. Ahh não poderia deixar de falar das ilustrações que são belíssimas, foram feitas por Daniel Santana que é graduado em desenho industrial pela UFBA, eu sou apaixonada pela cor amarelo então assim que vi Bucala com o vestido amarelo já amei, a imagem que mais gostei de todo o livro é a que Bucala está com a deusa das águas doce, uma imagem muito linda de ver.

Termino essa resenha com um trecho da dissertação - Artebagaço Odeart: Ecos Que Entoam A Mata Africano-Brasileira Do Cabula de Janice Sena Nicolin.

Do que pudemos averiguar, o Cabula, até o século XIX, abrigava em suas matas vários pousos e roças constituintes de uma comunalidade plantada por africanos rebelados contra a escravização e o colonialismo, embora este dado fosse ocultado pela Razão de Estado colonial e imperial da época. Nas matas do Cabula, estavam os mais valentes e fortes guerreiros que batalharam arduamente, derramaram sangue e plantaram o sentido de luta contra a servidão voluntária, contra a aceitação passiva de escravizados.

O lugar Cabula situa-se em um morro em Salvador e, mesmo, atualmente, século XXI, apesar da avassaladora devastação da natureza, o lugar ainda possui uma imensa reserva de Mata Atlântica, que é possível ver percorrendo ruas, ladeiras, becos, baixadas, estreitos caminhos, saltando pontes que separam a terra dos riachos, atualmente poluídos, compondo uma natureza geográfica de rico relevo.

É possível que, pela própria localização geográfica constituída por uma mata fechada, muito intensa até as cinco primeiras décadas do século XX, enquanto havia ocupação natural da população interna originária daquele lugar, tenha sido a condição favorável à forma social de quilombo no Cabula. Não sabemos quando chegaram os primeiros habitantes deste lugar, mas sabemos que fora constituído por uma territorialidade quilombola. Talvez este seja também um dado para analisarmos em futura pesquisa, assim como as origens e a expansão das comunalidades da nação Angola, que são muitas no Cabula.

Referência:              
NICOLIN, Janice Sena. Artebagaço Odeart: Ecos Que Entoam A Mata Africano-Brasileira Do Cabula. 2007. Dissertação (Mestrado em Educação e Contemporaneidade) - Universidade do Estado da Bahia.



Comentários

  1. Este foi o primeiro livro que meu filho leu sozinho e tenho um carinho grande por ele. Gostei da resenha e da foto demais, Lais Porto! Parabéns!!!

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